Entrevista com Ludovic Souliman - Editora Peirópolis

Entrevista com Ludovic Souliman

Você diz viver em Erquy, na Bretanha, sob uma falésia, “terra de mar e de horizontes onde, ao vento e a luz, lhes apetece jogar com as marés”. Nesse mar, você já encontrou uma garrafa com uma mensagem dentro?

LUDO: Eu moro em Côtes d’Armor, antiga Armorique – que para os Celtas significa “país de frente para o mar”. Atrás de minha casa, uma pequena trilha atravessa dois campos, e duas sebes de  plantas espinhosas levam à falésia. Lá de cima, em vejo bem distante e o vento é muito forte. Lá de cima, eu escuto o canto das ondas e o clamor do mar. Quando a maré está alta, as ondas chegam até às falésias, e quando está baixa, o mar se distancia, se afasta para longe e faz aparecer uma vasta faixa de areia e rochas que nós chamamos éstran. Ali, nesse mar, no qual amo mergulhar, nadar, pescar, não encontrei garrafas com mensagens, tampouco lampadas mágicas que escondessem gênios, mas uma fonte vívida, vivificante, onde me apaixonei pelo tempo de viver.

Ludovic Souliman em Janeiro/2014, retirada do site do autor.

Qual foi a história que te levou a ser um contador de histórias?

Aquela do pequeno Polegar que luta contra a miséria, o medo, o horror, os monstros e a escuridão para enfim achar a luz e reecontrar o caminho de volta graças às pedrinhas deixadas ao longo do caminho da vida – pedrinhas pretas, pedrinhas brancas, risos, lágrimas e cantos. É a história de minha vida, feita de encontros com mulheres e homens que viam em mim quem eu era, enquanto eu mesmo não o sabia, que deram tempo a si mesmos para que mudassem seus olhares sobre mim e que me deixaram fazer o mesmo com o meu olhar sobre eles e sobre o mundo. Eu penso especificamente no Sr. Maufret, um professor de Francês sem o qual eu jamais estaria onde estou hoje. Eu tinha onze anos e ingressava na quinto ano; jamais havia lido um livro e não gostava de Francês. Foi ele quem me apresentou ao gosto pela leitura e pelos livros, pela poesia e pelo teatro. Antes dele, eu era apenas um estudante preguiçoso, um grande sonhador condenado a anos de escola.

Você escreveu esse lindo conto acumulativo de solidariedade… Você acredita que os valores humanos mais fundamentais, que parecem tão esquecidos hoje, podem ser salvos através das histórias?

Sim. Cada história, cada conto, semeia suas sementes de luz e dá sentido à vida. Os contos são remédios poderossíssimos para salvar o mundo de cada um que os recebe como um presente e como uma esperança possível. Eu acredito nessa palavra nascida nas brumas do tempo, portadora de sonhos e de humanidade.

No final do livro, você conta uma experiência que teve com um brasileiro que morava em Nova York… Qual é a imagem que você tem do Brasil?

Eu tive a chance de participar duas vezes do festival Boca do céu, graças a Regina Machado, a quem eu agradeço aqui infinitamente por essa aventura, que mistura falas de contadores do mundo todo com aquelas de crianças e de contadores brasileiros. Mais tarde, voltei para uma atividade em plena natureza, em Minas Gerais. Minha experiência em cada uma dessas vezes, desses encontros em caminhos de contos e de memória foi algo muito forte do ponto de vista humano. Essa é a imagem que tenho do Brasil: essa chance do encontro com o outro na imensidão desse país que conheço tão pouco, na imensidão do mundo que renasce a cada segundo.

O que você diria àqueles que formam leitores nas escolas?

Contem-lhes histórias. Contar ou ler, pouco importa, mas falar sempre com o coração, com o ventre. Procurar a luz das palavras, o sabor da fruta madura.

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