prefácio de Álbum de família
Por Chico César
Carroça de Mamulengos é uma das mais importantes companhias culturais do Brasil. Uns dirão que é folclore. Eu digo que é sabedoria brincante apoiada em arte burilada na tradição movente dos saltimbancos de todos os tempos e todos os lugares – desde os mais remotos idos protoeuropeus até nosso fugidio presente. São atores, cantores, músicos, acróbatas, equilibristas para quem a origem popular e o autodidatismo não empanam o rigor nem a visão crítica a respeito do próprio trabalho. Tampouco, o que é raro hoje, de sua inserção no momento histórico e no ambiente social em que estão inseridos. São um grupo de intervenção, assim como os Fura del Balls da Catalunha ou a turma do Teatro Oficina de São Paulo.
Uma família sob o signo de gêmeos que trabalha signos do passado, no presente, para compreender e interferir na chegada do futuro. Práxis da contemporaneidade nas ruas de um país que tem dificuldade de autoconhecimento e de autoaceitação. Em incessante fluxo, por onde passam deixam pistas. Códigos. Decifrá-los é a questão. Chegará mais perto quem atravessar a névoa naïf e paternalista que costuma separar plateias urbanas e artistas populares. Este verá que, enquanto passam velozes os carros importados em nossas esburacadas estradas que levam à construção da identidade, a Carroça em seu próprio ritmo passa e fica. Permanece.
Chico César é compositor, cantor e escritor nascido no município de Catolé da Rocha (PB). É amigo da família Carroça de Mamulengos, que já incursionou com o músico paraibano pelo Brasil.
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