"Conto de escola" em HQ: Machado por Silvino - Editora Peirópolis

"Conto de escola" em HQ: Machado por Silvino

A grande admiração que Laerte Silvino, jovem quadrinista pernambucano, nutre por Machado de Assis, levou-o a realizar a transposição de Conto de escola, célebre título da safra machadiana, para a HQ. Conto de escola em quadrinhos é o 5o. título da coleção da Peirópolis dedicada à transposição de obras clássicas para a linguagem da HQ. O trabalho do pernambucano Silvino contou com a consultoria literária do professor Maurício Soares Filho.

Abaixo encontram-se disponíveis o prefácio de Maurício, o posfácio de Silvino e o texto de quarta capa.
Clique aqui para ver a entrevista com Laerte Silvino realizada por Maurício, que também atua como apresentador do programa Fala Fera, voltado para o público jovem, na TV União de São João da Boa Vista.

PREFÁCIO
Escola, um rito de passagem

A escola é palco de muitos acontecimentos. A despeito de todas as mudanças sofridas ao longo dos séculos, o espaço escolar continua a potencializar algumas vivências universais, e frequentá-lo é viver um rito de passagem. Ali se cruzam relações de poder e submissão, sentimentos de amizade e aversão, competição e solidariedade. Neste Conto de escola em quadrinhos, o mestre Machado de Assis descortina uma “cena de bastidores” repleta de afetos e significados. Pilar, seu narrador e protagonista, foi mandado para a escola pelo pai rigoroso para aprender a ser um homem responsável e trabalhador, mas foi lá que aprendeu a mentir e a delatar, apoiado pelo próprio sistema injusto que deveria torná-lo íntegro.

Machado, ao ambientar a narrativa numa escola, trabalha com a ideia, recorrente na literatura, do ambiente educacional como microcosmo da sociedade. Publicado em 1896 no volume Várias histórias, “Conto de escola” narra uma história que se passa em 1840, ano em que a maioridade de D. Pedro II, então com 15 anos incompletos, foi antecipada por uma manobra dos políticos liberais para encerrar a regência conservadora de Araújo Lima. Assim como Pilar aprendeu sobre corrupção, delação e injustiça, D. Pedro II aprenderia valores de que precisaria para se tornar um governante. No conto, a passagem do mundo infantil para o universo habitado por adultos sisudos e corruptos também faz alusão à maturidade forçada do menino destinado a governar o Brasil na ausência de seu pai. O rito de passagem do narrador pode ser lido, assim, como a transformação então vivida pelo país.

As metáforas pouco convencionais são um aspecto muito significativo do trabalho de Machado, e a versão em quadrinhos, que traz o texto na íntegra, não poderia eliminar o prazer do leitor em descobri-las. Laerte Silvino contribui com a narrativa machadiana ao explicitar, por meio das cores, alguns elementos fundamentais para a sua apreciação, especialmente ao explorar a subjetividade do narrador, que conta sua história infantil em primeira pessoa. Difícil tarefa para um quadrinista esta, ficar em silêncio para deixar Machado falar. Laerte Silvino não só dá conta do recado como aproxima o leitor do século XXI de um dos maiores exploradores da alma humana que já existiram.

A coleção Clássicos em HQ da Editora Peirópolis tem um mérito inquestionável: apresentar a leitores obras fundamentais para a formação de um repertório intelectual, sem facilitar os textos ou diminuir sua profundidade e grandeza.

Maurício Soares Filho


POSFÁCIO

Quando resolvi quadrinizar o “Conto de Escola”, sabia que não seria apenas uma aventura literária ao lado do meu escritor preferido em língua portuguesa, o Machado de Assis. Seria também um mergulho nas lembranças do meu próprio tempo de escola. Acredito que, antes de tudo, o livro trate disso, de lembranças. Por isso cuidei das memórias do seu Pilar como se fossem minhas, com o maior cuidado e conservando os mínimos detalhes.

Fiquei espantado ao encontrar, no texto, situações parecidas com algumas que vivi quando estava na escola. Também estudei em um sobradinho, também tive um professor que arrastava suas chinelas de couro pela sala, professor que inspirou essa minha versão do Policarpo. A diferença é que o meu se chamava Jorge e, na maioria das vezes, não era tão bravo como o personagem. O mais legal é que me identifico muito com o seu Pilar: como ele, sou filho de um militar e também rabiscava caricaturas dos professores ou qualquer outra coisa que convinha, cabulava muitas aulas e passava cola aos colegas. Ou seja, em outros tempos eu não escaparia da palmatória. Todas essas coincidências beneficiaram o processo criativo, fazendo com que fluísse calmamente, tornando-o mais divertido que trabalhoso.

Aprendi, com esta obra, que não se pode fazer muito esforço para ilustrar um texto do Machado de Assis. Está tudo lá, não há como fugir, ele nos serve com todas as imagens, restando-nos apenas desenhá-las.

Por fim, não poderia deixar de agradecer a todos da Peirópolis que abraçaram tão bem esse projeto e contribuíram tanto com suas opiniões; à Mirella, minha companheira, amiga e esposa; à Luiza, minha filha e razão de existir; às pessoas que conheci na escola e que ainda são os meus melhores amigos; ao Lin e ao Mascaro, por toda força e aprendizado; e ao Nelson Cruz, pela inspiração de quem já emprestou seu traço a esse mesmo texto e também por ter me indicado a Peirópolis como uma ótima opção de editora. Agradeço muito a Deus por me fazer viver de desenho.

Aos leitores deste livro que ainda estiverem na escola, digo que aproveitem este tempo e façam, cada um de vocês, o seu próprio conto de escola.

Boa leitura a todos!

Laerte Silvino


ORELHA

O crítico literário norte-americano Harold Bloom definiu Machado de Assis como um verdadeiro “milagre” das letras brasileiras. Afinal, era mesmo muito difícil imaginar que o menino mulato nascido num morro carioca em 1839, em pleno período da escravidão, conseguiria alcançar o respeito e a credibilidade que atingiu na vida adulta. Joaquim Maria Machado de Assis – poeta, dramaturgo, crítico literário, romancista e contista – impressiona até hoje leitores de todos os lugares do mundo com o poder surpreendente de revelar a profundidade psicológica de seus personagens.

Neste álbum, a Editora Peirópolis apresenta uma transposição de Machado de Assis para os quadrinhos. O texto escolhido foi “Conto de escola”, integrante do livro Várias histórias, de 1896, obra de um escritor já maduro e em pleno domínio de suas armas, exercitando a forma breve após terminar um romance – Quincas Borba, em 1891 – e guardando fôlego para a obra que o consagraria mundialmente: Dom Casmurro, em 1899. Trata-se de um belíssimo exemplar da sagacidade de Machado.

Conto de escola em quadrinhos traz o texto integral envolvido na leitura imagética do quadrinista Laerte Silvino, grande admirador de Machado de Assis. Laerte mostrou-se um excelente leitor, valendo-se da elegância e da sagacidade do escritor para realizar sua tradução em imagens. No conto roteirizado, Laerte abraça características importantes da obra de Machado, como o tom memorialista, para conduzir o leitor pelos caminhos da memória de Pilar no banco de escola.

Luciana Tonelli, coordenadora da coleção

Add Comment

Your email address will not be published. Required fields are marked *

Olá! Preencha os campos abaixo para iniciar a conversa no WhatsApp

PHP Code Snippets Powered By : XYZScripts.com